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Teorias de Campo Não Comutativas

Como exemplo de uma teoria de campos não comutativa, vamos considerar o modelo $\phi^4$ de um campo escalar real, expresso pela seguinte ação% latex2html id marker 11272
\setcounter{footnote}{2}\fnsymbol{footnote}:


$\displaystyle S[\phi]$ $\textstyle \equiv$ $\displaystyle \mbox{Tr} \left( \frac{1}{2} [\hat{\partial_{\mu}},
\hat{W}[\phi]]^2 + \frac{m^2}{2}\hat{W}[\phi]^2 + \frac{g^2}{4!}
\hat{W}[\phi]^4 \right)$  
  $\textstyle \equiv$ $\displaystyle \int d^D x \left\{ \frac{1}{2} \left[\partial_{\mu}
\phi(x)\right...
...^2(x) + \frac{g^2}{4!} \phi(x)
\ast \phi(x) \ast \phi(x) \ast \phi(x) \right\},$  

onde na segunda linha em % latex2html id marker 7014
$(\ref{eq.20})$ estamos utilizando a propriedade (4.10) do operador derivada.

Do cálculo acima podemos obter uma maneira muito simples de introduzir a não comutatividade na TQC. Basta escrevermos a lagrangiana do modelo usual com a troca dos produtos ordinários entre funções pelos produtos-estrela. Mais ainda, também consideramos que o produto-estrela entre duas funções dentro de uma integração em $x_{\mu}$ não é afetado pela não comutatividade do espaço, como vimos na Eq. (4.14)% latex2html id marker 11283
\setcounter{footnote}{3}\fnsymbol{footnote}. Desta forma, os propagadores da teoria não são alterados pela não comutatividade. Já os vértices passam a ser expressos, neste exemplo, por:


$\displaystyle \mbox{Tr} (\hat{W}[\phi])^4$ $\textstyle \equiv$ $\displaystyle \int d^D x \phi(x) \ast \phi(x)
\ast \phi(x) \ast \phi(x)$  
  $\textstyle =$ $\displaystyle \prod_{a=1}^4 \int d^D k_a \tilde{\phi}(k_a) \delta^D \left( \sum_{a=1}^4 k_a
\right) V(k_1,k_2,k_3,k_4),$  

onde definimos $V(k_1,k_2,k_3,k_4)$ como:


$\displaystyle V(k_1,k_2,k_3,k_4)$ $\textstyle =$ $\displaystyle \prod_{a<b} e^{- i k_a \wedge k_b}$  
  $\textstyle =$ $\displaystyle e^{- i (k_1 \wedge k_2 + k_3 \wedge k_4)}$  
  $\textstyle \equiv$ $\displaystyle \frac{1}{3} \left[\cos(k_1 \wedge k_2) \cos(k_3\wedge k_4) +\cos(k_1
\wedge k_3) \cos(k_2 \wedge k_4) \right.$  
  $\textstyle \qquad$ $\displaystyle \qquad + \left. \cos(k_1 \wedge k_4) \cos(k_2 \wedge k_3)\right].$ (4.15)

Na última passagem em (4.18) usamos o fato de $V$ estar sendo integrado em $k_a$ através da Eq. (4.17). Além disso estamos definindo de forma compacta $k \wedge p \equiv
\frac{1}{2} \theta^{\mu \nu} k_{\mu} p_{\nu}$ e vamos considerar o caso onde $\theta^{0i}=0$% latex2html id marker 11306
\setcounter{footnote}{4}\fnsymbol{footnote}

Como um exemplo de cálculo, considere a correção de massa a um laço, neste caso dada por:


$\displaystyle \Delta m^2$ $\textstyle \equiv$ $\displaystyle \int \frac{d^D k}{(2 \pi)^D} \frac{\frac{1}{3} \left[ 2
\cos^2(k\wedge p) + 1\right]}{k^2 + m^2}$  
  $\textstyle =$ $\displaystyle \int \frac{d^D k}{(2 \pi)^D} \frac{\frac{1}{3} \left[2 + \cos(2
k\wedge p) \right]}{k^2 + m^2}$  
  $\textstyle \equiv$ $\displaystyle \Pi_p + \Pi_{np},$ (4.16)

onde definimos:


\begin{displaymath}
\Pi_p \equiv \frac{2}{3} \int \frac{d^D k}{(2 \pi)^D} \frac{ 1 }{k^2 + m^2},
\end{displaymath} (4.17)

e


$\displaystyle \Pi_{np}$ $\textstyle \equiv$ $\displaystyle \frac{1}{3} \int \frac{d^D k}{(2 \pi)^D} \frac{\cos
( 2 k\wedge p) }{k^2 + m^2}$  
  $\textstyle =$ $\displaystyle \frac{1}{3} \int \frac{d^D k}{(2 \pi)^D} \frac{e^{2 i(k\wedge p)}
}{k^2 + m^2}.$ (4.18)

Neste modelo simples, já podemos observar um aspecto interessante de teorias não comutativas: a decomposição dos diagramas de Feynman em duas componentes com comportamentos distintos, chamadas planares e não planares. As contribuições planares ($\Pi_p$ no nosso caso), a menos de uma fase que depende exclusivamente dos momentos externos e fatores numéricos, são equivalentes às da teoria comutativa. Já as não planares ($\Pi_{np}$) misturam dentro do integrando o momento externo com o de integração, por meio de fatores oscilatórios. Partindo da Eq. (4.17) e da primeira linha em (4.18), podemos generalizar esta discussão de forma a obter a expressão dos vértices em uma teoria qualquer. Assim, para uma interação contendo $n$ campos $\phi_1
... \phi_n$, temos que:


$\displaystyle \mbox{Tr} (\hat{W}[\phi_1] \hat{W}[\phi_2] ... \hat{W}[\phi_n] )$ $\textstyle \equiv$ $\displaystyle \int d^D x \phi_1(x) \ast \phi_2(x) \ast ... \ast \phi_n(x)$  
  $\textstyle =$ $\displaystyle \int \prod_{a=1}^n d^D k_a \tilde{\phi_a}(k_a) \delta^D \left( \sum_{a=1}^n k_a
\right) V(k_1,k_2,...,k_n),$  

com


\begin{displaymath}
V(k_1,k_2,...,k_n) = \prod_{a<b} e^{- i k_a \wedge k_b}.
\end{displaymath} (4.19)

Como vemos, os vértices da teoria não comutativa carregam uma fase que depende dos momentos e esta é a principal diferença com relação ao caso comutativo. Mais ainda, é possível demonstrar que $V$ sempre pode ser expresso em termos de componentes planares e não planares, com as características acima apresentadas [22,46].

Voltando ao cálculo que estamos desenvolvendo, em particular para $D=4$, podemos perceber que $\Pi_p$ é quadraticamente divergente. Já $\Pi_{np}$ não apresenta divergências no ultravioleta, devido ao fator oscilatório no numerador. Este corte das divergências ultravioletas, típico das contribuições não planares, parece indicar que a expectativa inicial de melhora destas divergências em uma teoria não comutativa se justifica. Entretanto, como veremos a seguir, o que irá aparecer agora é um outro tipo de divergência nestes diagramas na região do infravermelho. Calculando $\Pi_{np}$ [47,22,44], chegamos a:


\begin{displaymath}
\Pi_{np} (p) \sim \frac{1}{96 \pi^2} \left( \Lambda_{eff}^2 - m^2
\ln{\frac{\Lambda_{eff}^2}{m^2}}\right),
\end{displaymath} (4.20)

com


\begin{displaymath}
\Lambda_{eff}^2 = \frac{1}{\frac{1}{\Lambda^2} + \tilde{p}^2},
\end{displaymath} (4.21)

onde definimos $\tilde{p}\equiv \theta^{ij}p_j$. Além disso, o parâmetro extra $\Lambda$ foi introduzido nas passagens intermediárias de forma a facilitar as contas e deve tender a infinito no resultado final. Se considerarmos este limite, obtemos:


\begin{displaymath}
\Pi_{np} \sim \frac{1}{96 \pi^2} \left( \frac{1}{\tilde{p}^2} - m^2 \ln
\frac{1}{\tilde{p}^2 m^2}\right),
\end{displaymath} (4.22)

Por outro lado, se ao invés disso, mantivermos $\Lambda$ fixo e fizermos $\tilde{p} =0$ na Eq. (4.24), temos


\begin{displaymath}
\Pi_{np} \sim \frac{1}{96 \pi^2} \left( \Lambda^2 - m^2 \ln
\frac{\Lambda^2}{m^2}\right).
\end{displaymath} (4.23)

Aqui aparece uma das principais características de teorias não comutativas. Da Eq. (4.26) podemos perceber que embora $\Pi_{np}$ seja finito para $\tilde{p} \ne 0$, ao contrário da contribuição planar, ele apresenta uma divergência infravermelha expressa pela singularidade em $\tilde{p} =0$: se tentarmos retirar a não comutatividade, ou mesmo mantendo $\theta$ fixo, mas tendendo $p\equiv \vert\vec{p}\vert$ a zero, recuperaremos a divergência quadrática do caso comutativo. Por outro lado, a inversão dos limites realizada em (4.27) é suficiente para retirar a não comutatividade do modelo, mas recupera a divergência quadrática, expressa em $\Lambda$ (de certa forma este parâmetro está associado com o limite ultravioleta). Assim, as duas divergências se misturam em uma teoria não comutativa e a expectativa inicial de que a introdução de coordenadas que não comutam poderia resolver o problema ultravioleta não se observa. Este fenômeno é conhecido com mistura infravermelho-ultravioleta (UV/IR) e é comum de teorias não comutativas [47]. Tal comportamento pode ser melhorado em alguns modelos supersimétricos [48].




A quantização de teorias de calibre em espaços não comutativos requer atenção na definição das derivadas covariantes e transformações de calibre utilizadas, uma vez que os produtos de campos agora dependem da ordem. Considere, por exemplo a teoria de um campo escalar complexo $\phi$ acoplado a um campo de calibre $A_{\mu }$, expresso pela seguinte lagrangiana comutativa:


\begin{displaymath}
{\cal L}^{(c)} = (D_{\mu} \phi)^{\dagger} (D^{\mu} \phi) - m^2
\phi^{\dagger} \phi,
\end{displaymath} (4.24)

onde estamos considerando $D_{\mu} \phi \equiv (\partial - i
e A_{\mu})\phi$.

Como vimos anteriormente, a teoria não comutativa é obtida a partir de ${\cal L}^{(c)}$ através da troca do produto usual pelo produto-estrela dos campos. Porém, se quisermos preservar a invariância de calibre da teoria, devemos nos preocupar com a ordem em que escrevemos tais produtos. Se fizermos o mapeamento:


\begin{displaymath}
\phi^{\dagger} \phi \rightarrow \phi^{\dagger} \ast \phi, \q...
...phi) \rightarrow (D_{\mu}
\phi)^{\dagger} \ast (D^{\mu} \phi),
\end{displaymath} (4.25)

devemos definir as transformações de calibre como sendo:


\begin{displaymath}
\phi \rightarrow (e^{i \Lambda})_{\ast} \ast \phi, \qquad
\p...
...ger} \rightarrow \phi^{\dagger} \ast (e^{-i \Lambda})_{\ast},
\end{displaymath}


\begin{displaymath}
A_{\mu} \rightarrow (e^{i \Lambda})_{\ast} \ast A_{\mu} \ast...
...} (e^{i \Lambda})_{\ast}\right]
\ast (e^{- i \Lambda})_{\ast},
\end{displaymath}

e a derivada covariante:


\begin{displaymath}
D_{\mu} \phi = \partial_{\mu} \phi + i A_{\mu} \ast \phi,
\end{displaymath} (4.26)

de forma a manter a invariância de calibre. Aqui $(e^{i \Lambda})_{\ast} $ representa a transformação de calibre no espaço não comutativo e é expresso por:


\begin{displaymath}
(e^{i \Lambda})_{\ast} = 1 + i \Lambda + \frac{i^2}{2} \Lambda \ast
\Lambda + ...
\end{displaymath} (4.27)

A lagrangiana não comutativa assim obtida é escrita como;


\begin{displaymath}
{\cal L} = (D_{\mu} \phi)^{\dagger} \ast (D^{\mu} \phi) - m^2
\phi^{\dagger} \ast \phi,
\end{displaymath} (4.28)

e a teoria de campos descrita no espaço não comutativo por ${\cal L}$ é dita estar na representação fundamental à esquerda.

Similarmente, podemos obter as representações à direita e adjunta. Por exemplo, na representação à direita, ao invés de considerarmos a versão não comutativa expressa pelas Eqs. (4.29) e (4.30), o mapeamento considerado é:


\begin{displaymath}
\phi^{\dagger} \phi \rightarrow \phi \ast \phi^{\dagger} \qq...
...\phi) \rightarrow (D_{\mu} \phi)\ast
(D^{\mu} \phi)^{\dagger},
\end{displaymath} (4.29)

de tal forma que os campos escalares se transformam como:


\begin{displaymath}
\phi \rightarrow \phi \ast (e^{i \Lambda})_{\ast} , \qquad
\...
...gger} \rightarrow (e^{-i \Lambda})_{\ast} \ast
\phi^{\dagger}.
\end{displaymath} (4.30)

A transformação do campo $A_{\mu }$ não se altera e a derivada covariante passa a ser expressa por:


\begin{displaymath}
D_{\mu} \phi = \partial_{\mu} \phi - i \phi \ast A_{\mu}.
\end{displaymath} (4.31)

A teoria de Chern-Simons em $(2+1)$ dimensões é definida incorporando à lagangiana do campo de calibre um termo do tipo:


\begin{displaymath}
{\cal L}_{CS} \equiv \frac{\kappa}{2} \epsilon^{\mu \nu \lam...
... + \frac{2 i}{3}
A_{\mu}\ast A_{\nu} \ast A_{\lambda} \right).
\end{displaymath} (4.32)

Um comportamento interessante já pode ser percebido neste modelo. Como no espaço não comutativo a ordem do produto dos campos importa, agora, apesar de ainda estarmos considerando campos de calibre abelianos, existe em ${\cal L}_{CS}$ um termo trilinear em $A_{\mu }$, típico de teorias não abelianas. Este termo modifica intrinsicamente o comportamento dos modelos e como veremos mais adiante, passaremos agora a obter vários comportamentos qualitativamente mais próximos de uma teoria não abeliana.


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