Como exemplo de uma teoria de campos não comutativa, vamos
considerar o modelo de um campo escalar real, expresso pela
seguinte ação
:
onde na segunda linha em estamos utilizando a
propriedade (4.10) do operador derivada.
Do cálculo acima podemos obter uma maneira muito simples de
introduzir a não comutatividade na TQC. Basta escrevermos a
lagrangiana do modelo usual com a troca dos produtos ordinários
entre funções pelos produtos-estrela. Mais ainda, também
consideramos que o produto-estrela entre duas funções dentro de uma
integração em não é afetado pela não
comutatividade do espaço, como vimos na
Eq. (4.14)
. Desta forma, os
propagadores da teoria não são alterados pela não
comutatividade. Já os vértices passam a ser expressos, neste
exemplo, por:
onde definimos
como:
Na última passagem em (4.18) usamos o fato de
estar sendo integrado em
através da Eq. (4.17). Além
disso estamos definindo de forma compacta
e vamos considerar o
caso onde
Como um exemplo de cálculo, considere a correção de massa a um laço, neste caso dada por:
![]() |
![]() |
![]() |
|
![]() |
![]() |
||
![]() |
![]() |
(4.16) |
onde definimos:
![]() |
(4.17) |
e
![]() |
![]() |
![]() |
|
![]() |
![]() |
(4.18) |
Neste modelo simples, já podemos observar um aspecto interessante de
teorias não comutativas: a decomposição dos diagramas de
Feynman em duas componentes com comportamentos distintos, chamadas
planares e não planares. As contribuições planares ( no
nosso caso), a menos de uma fase que depende exclusivamente dos
momentos externos e fatores numéricos, são equivalentes às da
teoria comutativa. Já as não planares (
) misturam dentro
do integrando o momento externo com o de integração, por meio de
fatores oscilatórios. Partindo da Eq. (4.17) e da primeira
linha em (4.18), podemos generalizar esta discussão de
forma a obter a expressão dos vértices em uma teoria
qualquer. Assim, para uma interação contendo
campos
, temos que:
![]() |
![]() |
![]() |
|
![]() |
![]() |
com
![]() |
(4.19) |
Como vemos, os vértices da teoria não comutativa
carregam uma fase que depende dos momentos e esta é a principal
diferença com relação ao caso comutativo. Mais ainda, é
possível demonstrar que sempre pode ser expresso em termos de
componentes planares e não planares, com as características
acima apresentadas [22,46].
Voltando ao cálculo que estamos desenvolvendo, em particular para
, podemos perceber que
é quadraticamente
divergente. Já
não apresenta divergências no
ultravioleta, devido ao fator oscilatório no numerador. Este corte
das divergências ultravioletas, típico das contribuições
não planares, parece indicar que a expectativa inicial de melhora destas
divergências em uma teoria não comutativa se
justifica. Entretanto, como veremos a seguir, o que irá aparecer
agora é um outro tipo de divergência nestes diagramas na região
do infravermelho. Calculando
[47,22,44], chegamos a:
com
![]() |
(4.21) |
onde definimos
. Além
disso, o parâmetro extra
foi introduzido nas passagens
intermediárias de forma a facilitar as contas e deve tender a
infinito no resultado final. Se considerarmos este limite, obtemos:
Por outro lado, se ao invés disso, mantivermos fixo e
fizermos
na Eq. (4.24), temos
Aqui aparece uma das principais características de teorias não
comutativas. Da Eq. (4.26) podemos perceber que embora
seja finito para
, ao contrário da
contribuição planar, ele apresenta uma divergência
infravermelha expressa pela singularidade em
: se
tentarmos retirar a não comutatividade, ou mesmo mantendo
fixo, mas tendendo
a zero, recuperaremos a
divergência quadrática do caso comutativo. Por outro lado, a
inversão dos limites realizada em (4.27) é suficiente para
retirar a não comutatividade do modelo, mas recupera a divergência
quadrática, expressa em
(de certa forma este parâmetro
está associado com o limite ultravioleta). Assim, as duas
divergências se misturam em uma teoria não comutativa e a
expectativa inicial de que a introdução de coordenadas que não
comutam poderia resolver o problema ultravioleta não se observa.
Este fenômeno é conhecido com mistura infravermelho-ultravioleta
(UV/IR) e é comum de teorias não comutativas [47]. Tal
comportamento pode ser melhorado em alguns modelos supersimétricos
[48].
A quantização de teorias de calibre em espaços não
comutativos requer atenção na definição das derivadas
covariantes e transformações de calibre utilizadas, uma vez que
os produtos de campos agora dependem da ordem. Considere, por exemplo
a teoria de um campo escalar complexo acoplado a um campo de
calibre
, expresso pela seguinte lagrangiana comutativa:
![]() |
(4.24) |
onde estamos considerando
.
Como vimos anteriormente, a teoria não comutativa é obtida a
partir de
através da troca do produto usual pelo
produto-estrela dos campos. Porém, se quisermos preservar a
invariância de calibre da teoria, devemos nos preocupar com a ordem
em que escrevemos tais produtos. Se fizermos o mapeamento:
devemos definir as transformações de calibre como sendo:
e a derivada covariante:
de forma a manter a invariância de calibre. Aqui
representa a transformação de calibre
no espaço não comutativo e é expresso por:
![]() |
(4.27) |
A lagrangiana não comutativa assim obtida é escrita como;
![]() |
(4.28) |
e a teoria de campos descrita no espaço não comutativo
por é dita estar na representação fundamental à
esquerda.
Similarmente, podemos obter as representações à direita e adjunta. Por exemplo, na representação à direita, ao invés de considerarmos a versão não comutativa expressa pelas Eqs. (4.29) e (4.30), o mapeamento considerado é:
![]() |
(4.29) |
de tal forma que os campos escalares se transformam como:
![]() |
(4.30) |
A transformação do campo não se
altera e a derivada covariante passa a ser expressa por:
![]() |
(4.31) |
A teoria de Chern-Simons em dimensões é definida
incorporando à lagangiana do campo de calibre um termo do tipo:
Um comportamento interessante já pode ser percebido neste
modelo. Como no espaço não comutativo a ordem do produto dos
campos importa, agora, apesar de ainda estarmos considerando campos de
calibre abelianos, existe em um termo trilinear em
, típico de teorias não abelianas. Este
termo modifica intrinsicamente o comportamento dos modelos e como
veremos mais adiante, passaremos agora a obter vários comportamentos
qualitativamente mais próximos de uma teoria não abeliana.